Davi
não foi a única pessoa a clamar: “Lava-me!” (Sl 51.2). Antes e depois
dele, na história bíblica e na história eclesiástica, muitos têm dobrado
os joelhos e feito a mesma súplica, tanto pessoal como representativa.
O
jornal católico “O Lutador”, em agosto de 2011, publicou um belo texto
escrito pelo frei Patrício Alessandro Sciadini, de 64 anos, frade
carmelita nascido na Itália, missionário no Brasil, conhecido como
pregador de retiros espirituais e tradutor de algumas obras clássicas de
espiritualidade. Embora use a primeira pessoa do singular, Sciadini
certamente não está se referindo apenas a sua própria sujeira. Trata-se
antes de uma confissão representativa que todos deveríamos assinar. A
palavra “sujo” aparece várias vezes, como se pode ver em seguida:
Toda
Quinta-Feira Santa, sinto-me como sacerdote pequeno-grande, “sujo”, um
pouco traidor e medroso como os apóstolos no Cenáculo.
Sinto-me
“sujo” por fora e por dentro. Tenho caminhado pelas estradas do mundo e
tenho me deixado contaminar por tanta sujeira; pela sujeira do
relativismo teológico e moral.
Sou sujo porque tenho fugido da cruz e fingido amá-la.
Estou
“sujo” pelos meus pecados e pelos pecados dos outros, por todas as
vezes que não tenho dado bom exemplo e não tenho falado a verdade por
medo dos outros; tenho mimetizado e dulcificado o evangelho de Jesus
para não perder amigos e amigas.
Tenho o coração
“sujo” porque não sei amar, ou amo fazendo particularidades e separando a
humanidade em bons e maus, deixando de lado tantos irmãos e irmãs que
vivem ao meu redor e que são, sem dúvida, melhores do que eu.
O coração está “sujo” porque apegado às coisas da terra, e não sei olhar para o céu.
Senhor,
sinto-me “sujo”. É por isso que em cada Quinta-Feira Santa quero que tu
me laves, não os pés, mas todo o corpo, a alma, o coração, para que
possa sentar-me na Ceia e ser digno de comer do teu corpo e beber do
teu sangue. Sei que voltarei a sujar a minha vida, mas sei também que a
tua misericórdia me chamará de novo para ser purificado.
Não
há como duvidar, Senhor, que todo pecado é traição do teu amor, mas que
os pecados dos teus ministros sacerdotes, bispos de tua Igreja, e mesmo
do papa, por mínimos que sejam, são sempre grandes porque todos os
olhos do povo peregrino, nômade, sofrido nas noites escuras, fixam-se em
nós, procurando em nós o rosto de Cristo.
Que te
posso dizer, Senhor? Sou um sacerdote sujo: lava-me, purifica-me e
torna-me capaz de derramar sobre os outros, pelo sacramento da
confissão, o teu sangue que lava e dá nova vida a todos os pecadores.
Deixa, Senhor, que eu desça de meu pedestal e imite a ti, não só uma
vez, no rito de Quinta-Feira Santa, no lava-pés, mas todos os dias eu
saiba me cingir de toalhas e lavar os pés dos outros e enxugá-los!
Fonte: “O Lutador”, 11-20 ago. 2011, p. 13.
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