OPINIãO
29 de novembro de 2011
Crônica de um carrapato
Era
uma vez um carrapato. Vivia sossegado em seu cachorro, perto da
floresta. Fazia suas atividades, tocava sua vida. Sempre como um
carrapato.
Até que, um dia, soube da notícia de um
carrapato vindo de um cachorro lá da terra dos Andes. O carrapato
andino fazia chover, fazia trovejar, aumentava exponencialmente a
quantidade de carrapatos a lhe servirem no cachorro. Dizia-se que o
carrapato andino tinha uma comunicação toda especial com o Dono da
matilha, que é o mesmo Dono da matilha brasileira. O carrapato andino
até mesmo andou dizendo que ele tinha que mudar de cachorro. Nada de
chiuaua, tinha que ser são-bernardo pra cima.
Daí
nosso carrapato ficou animado. Estava cansado daquele cachorro que
ficava na floresta. Decidiu que ele seria uma espécie de pai de todos os
carrapatos do Brasil, e que merecia um cachorro maior, bem maior. Ele
decretou que era, a partir dali, um carrapato nobre, e que todos os que
se curvassem a ele também seriam coroados com a nobreza carrapatal. Como
ele sempre sugava na parte de trás do cachorro, tratou logo de se mudar
para a cabeça do bicho, já que, como ele mesmo dizia, os carrapatos
nasceram para a cabeça, e não para a cauda. Essa virou seu lema, sua
visão, sua missão. Aliás, para manter-se no topo da cabeça do cachorro,
nosso carrapato sempre tinha visões e alucinações. Afinal, como dizem,
camarão que dorme a onda leva, e ele queria mesmo era produzir as ondas
para tragar tudo para si.
Nessa ilusão, recebeu o
apoio de uma carrapata que tinha a curiosa habilidade das pulgas, pois
pulava de cão em cão, e que até mesmo havia profetizado a volta do Dono
da matilha toda para uma data bem próxima. Quando o Dono não voltou, a
carrapata-pulga deu um pulo altíssimo para os States, afirmando ser essa
uma direção vinda de uma mensagem do Dono da matilha.
Quando
todos os carrapatos se esqueceram dessa bobagem (carrapato tem memória
curta, ainda mais carrapato brasileiro, que engole tudo), a
carrapata-pulga deu total e irrestrito ao agora chamado “pairrapato”.
Mas
o carrapato, ops, pairrapato, não estava satisfeito. Achando-se grande,
mesmo sendo um carrapato, determinou, desafiando o Dono da matilha, que
agora seria o pai espiritual brasileiro. Não só dos carrapatos, mas
também de todos os cachorros.
O que o pairrapato
não sabe é que ele continua sendo carrapato. Sugando o sangue do
cachorro e transmitindo-lhe doenças. O carrapato também não sabe, mas é
que o Dono da matilha também está de olho. O Dono está vendo como seus
cachorros estão anêmicos e doentes. Como já comprou um remédio contra
carrapatos, pulgas e carrapatos-pulgas, logo, logo ele fará uma boa
limpeza nos seus cachorros, com direito a tosa.
E o
pairrapato, continuando carrapato, será jogado na lixeira, junto com a
carrapata-pulga e todos os carrapatos que se associaram a essa sandice
de matar o cachorro de inanição. E, juntos, serão incinerados, por quase
terem matado o cachorro de doenças.
Pois nasceram carrapatos, mas não quiseram deixar de ser carrapatos. E serão descartados para sempre como carrapatos.
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